Guia para um junho de festa.
Junho é sinónimo de sardinha asssada, arraiais e festas populares. Junho é, pois, sinónimo de Lisboa. Deixamos o Guia para um mês de Santos à medida de cada um.
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Junho é sinónimo de sardinha asssada, arraiais e festas populares. Junho é, pois, sinónimo de Lisboa. Deixamos o Guia para um mês de Santos à medida de cada um.
O labor pode atualmente não ser tão intenso como aquele a que se assistia no princípio do século XIX. Contudo, em Ílhavo, na fábrica de porcelana Vista Alegre, trabalham ainda hoje mais de 600 pessoas. Contribuem, por ano, para uma produção de 15 milhões de peças em porcelana, cristal e vidro. Visitámos a primeira empresa nacional de porcelana, fundada há 190 anos. O complexo conta, ainda, com um Museu, o bairro operário ali criado e ativo até 2010 e a Capela da Nossa Senhora da Penha de França, padroeira da Vista Alegre.
Texto e Fotos | Ana Clara
A algumas dezenas de quilómetros do centro da cidade de Ílhavo está situada a conhecida Vista Alegre Atlantis, numa antiga quinta do bispo de Miranda, D. Manuel de Moura Manoel, inquisidor-mor e reitor da Universidade de Coimbra em meados do século XVII, e sepultado na Capela da Nossa Senhora da Penha de França, também no interior do complexo da fábrica, e santa padroeira da Vista Alegre.
Quando entramos na propriedade, abre-se um mundo que nos faz recuar quase duzentos anos em vários aspetos e nos transporta ao início do século XIX. Foi precisamente a 1 de julho de 1824 que José Ferreira Pinto Basto teve o «sonho visionário» de fazer deste negócio «um sucesso» e que viria a registar «uma notoriedade exemplar», nota Filipa Quatorze, responsável de Marketing da empresa, que nos acompanha na visita ao complexo.
Os jogos de luzes e de sombras entrecortadas pelas folhas das árvores no exterior, que povoam os ambientes entre a capela, o bairro operário que ali funcionou até 2010 (ano em que foram despejados os últimos trabalhadores reformados que ali residiam) e a fábrica, dão um ambiente peculiar ao local, que, ao final da tarde, com o sol a pôr-se, ganha outra cor.
Esta reportagem começa precisamente pela visita ao mundo de Pinto Basto precisamente pela fábrica, onde atualmente trabalham mais de 600 pessoas.
Filipa Quatorze, diz-nos que a cerâmica Vista Alegre distingue-se por determinadas características como «a sua brancura, translucidez, resistência mecânica e uma sonoridade própria».
A primeira fase de todo o processo, que combina manufatura com tecnologia de ponta, constitui o chamado «circuito tradicional de produção» e designa-se por «conformação por via líquida», explica Filipa, adiantando que se trata de uma técnica de produção que usa a pasta de porcelana no seu estado líquido.
«É a primeira fase do processo, é uma técnica tradicional, e tem como objetivo produzir peças de formas irregulares ou peças ocas, como terrinas, caixas ou açucareiros, por exemplo», vinca a responsável da Vista Alegre Atlantis.
Depois todo o processo passa pelos moldes, em gesso, salientando a forma do objeto, seguindo-se a chamada tubagem onde «se enche de pasta líquida o molde».
As peças seguem depois para a roda de oleiro e, «depois para uma zona de estufa, para secagem. De seguida dá-se o acabamento, onde são retiradas as imperfeições e irregularidades e se uniformiza a superfície das peças».
«Depois voltam à linha e são colocadas em prateleiras e carros e seguem para o forno», acrescenta Filipa.
A maioria das peças é produzida de modo tradicional, sendo que a tecnologia de ponta também está presente nalguns processos, «em linhas mais direitas e simples», como em objetos como pratos, travessas e chávenas. «A Vista Alegre também se caracteriza por isso, pela combinação do tradicional com o moderno, adaptando-se à evolução da própria indústria também».
Museu, bairro e capela:
Seguimos depois para o Museu da Vista Alegre, inaugurado em 1964, e situado ao lado da Fábrica. Um projeto, adianta Filipa Quatorze, que «é também a concretização do que se vinha delineando desde o início da laboração da fábrica».
Em várias salas o visitante pode contemplar a «evolução histórica da porcelana» ao longo de quase 200 anos e «apreciar peças em vidro e cerâmica, as mais representativas da empresa», desde a sua fundação até aos dias de hoje.
Os núcleos principais do museu comportam as coleções em cristal e vidro, pó de pedra e porcelana, provenientes da produção a fábrica desde 1824 até à atualidade. Há uma sala dedicada ao fundador José Pinto Basto e o contributo que deu para a fundação da primeira empresa a fabricar porcelana em Portugal.
Um outro espaço é dedicado ao período do vidro (que representa os primórdios da fábrica) e outro espaço onde se observam as obras que resultaram nos primeiros ensaios de porcelana.
O chamado período de «esplendor de ouro» também tem destaque neste Museu, sendo considerado o momento áureo da produção da Vista Alegre, quando a empresa contratou Victor Rousseau, um francês com qualidades ímpares de desenhador e pintor, e que foi também responsável pela formação de gerações de mestres da Vista Alegre. A arte na pintura cerâmica, o desenho e a arte nova aplicada à cerâmica são outras componentes do espaço.
Ao lado da Fábrica e do Museu, está situado o bairro operário da Vista Alegre, um dos raros casos em Portugal, que resultou de um projeto social privado que criou uma «autêntica aldeia industrial».
A sua construção começou pouco depois da fundação da fábrica, e aqui moraram durante décadas os operários da fábrica e as suas famílias. Havia assistência médica, um colégio, corpo de bombeiros e várias atividades escolares e culturais para as crianças.
Uma forma, resume Filipa Quatorze, de «sedimentar a fixação populacional» e que, ao mesmo tempo, «marcava uma unidade ímpar» no desenvolvimento industrial da região e do país.
A visita termina depois na Capela da Nossa Senhora da Penha de França, padroeira da Vista Alegre, e mandada edificar em finais do século XVII pelo Bispo de Miranda, D. Manuel de Moura Manoel. Um edifício imponente e que se destaca pela fachada principal que apresenta uma imagem em pedra trabalhada da Nossa Senhora da Penha de França.
No interior destacam-se os azulejos setecentistas, os retábulos em mármore e talha dourada e as abóbadas decoradas com frescos do tempo da sua construção.
Importa recordar que em 2001, o Grupo Vista Alegre fundiu-se com o grupo Atlantis, sendo que em 2009, a empresa foi adquirida pelo Grupo Visabeira. Produz atualmente cerca de 15 milhões de peças por ano (em porcelana, cristal e vidro, nos segmentos de mesa, decorativo, bar e doméstico) exportando os seus produtos para mais de 60 países em todo o mundo.
A camarinha é uma baga comum nas dunas do pinhal de Leiria. Em agosto atinge o seu esplendor, quando se transforma numa pérola branca, outrora símbolo das lágrimas da Rainha Santa Isabel chamando por El-Rei D. Dinis. É com estas bagas que Fátima Rodrigues, da Saborear - Eventos e Marés, faz desde 2008 geleias artesanais, «únicas no país».
Texto e Fotos | Ana Clara
A camarinha, com o nome científico de Corema Album, é uma baga de cor branca e tem como habitat preferido regiões do litoral, ornadas por sistemas dunares. Assim acontece nas proximidades do pinhal de Leiria, onde a floresta ganha um encanto especial em Agosto, quando as camarinhas, tornando-se pequenas pérolas, atingem o seu esplendor.
Foi nas camarinhas, quase exclusivamente do litoral português (também povoam uma pequena área nas Ilhas Cíes, na Galiza, Espanha), que Fátima Rodrigues encontrou a inspiração para produzir uma geleia que diz «ser a única» a fazer no país.
O sabor, explica, «é levemente ácido» mas ao mesmo tempo «fresco» e «muito apreciado por quem compra».
«Ao longo dos tempos, as pessoas da costa levavam muitas camarinhas para casa e depois faziam doce. Achei que era uma coisa que não se podia perder e decidi comercializar. Sou a única pessoa a vender a geleia e é uma grande paixão», afirma Fátima.
Um fruto que povoa o pinhal de Leiria e que, na opinião da nossa interlocutora, «devia ser mais aproveitado turisticamente».
Fátima recorda que nos anos de 1960 e 1970 «a camarinha era transportada em cestos de verga e vendida em cartuxo de papel, tal como se fazia com os tremoços e pevides. Havia tanto nas ruas como na entrada do cinema da Figueira da Foz. Lembro-me que faziam tanto sucesso como as pipocas».
E acrescenta: «até há bem pouco tempo sei que se vendiam na praia da Nazaré e da Vieira (de Leiria)».
O processo de produção, todo ele artesanal, «é moroso», já que a camarinha «é apanhada no local, escolhida, lavada, cozida e filtrada várias vezes para ficar translúcida. Depois apanha calor e muda de cor».
Por onde passa, sejam feiras gastronómicas ou eventos turísticos, Fátima Rodrigues, segue sempre acompanhada da famosa Lenda da Camarinha, que «mostra como nasceu esta baga». «Conta-se que o rei D. Dinis andava no pinhal de Leiria, e um dia, ausentou-se. A rainha Santa Isabel foi à procura dele, e quando o viu chegar, começou a chorar. As lágrimas, simbolicamente, derramaram por todo o pinhal e cristalizaram em pérolas», conta a Fátima.
Rezava a lenda: «Dizem que Santa Isabel, Rainha de Portugal, montando branco corcel percorria o seu pinhal! “Ai do meu Esposo! Dizei! Dizei-me, robles reais! Meu Dinis! Senhor meu Rei! Em que braços suspirais?! (…) Mas cristalizou-se o pranto em muitas bagas branquinhas e transformou-se num manto de brilhantes camarinhas!...».
Com uma oficina particular em Leiria, a doceira faz do negócio gourmet «algo diferente do que normalmente se vê». Além da geleia de camarinha, Fátima produz também compotas de ruibarbo, geleia de pétalas de papoila, doces de figo, amoras e peras, marmelada de maçã e bolachas artesanais.
A doceira escoa os produtos em feiras e por encomenda, estando atualmente a tentar entrar na exportação, sobretudo para a Europa. «É um produto único, só nosso, que mais nenhum país pode aproveitar», adianta.
«Maravilhosa vida marítima moderna,
Toda limpeza, máquinas e saúde!
Tudo tão bem arranjado, tão espontaneamente ajustado,
Todas as peças das máquinas, todos os navios pelos mares,
Todos os elementos da actividade comercial de exportação e importação
Tão maravilhosamente combinando-se
Que corre tudo como se fosse por leis naturais,
Nenhuma coisa esbarrando com outra!”
Álvaro de Campos, «Ode Marítima»
Importante entreposto comercial do país, o porto de Lisboa era, nas primeiras décadas do século XX, uma autêntica cidade dentro da capital. Era ponto de chegadas e partidas, pescadores e peixeiras lisboetas trabalhavam de «sol a sol», turistas envolviam-se na multidão frenética onde oficiais da Marinha tentavam o namorico de circunstância. Hoje, o retrato é «bem diferente», como revela Pedro Castro Henriques, autor da obra «Do Vasto e Belo Porto de Lisboa», publicada em outubro de 2013. Recomendamos leitura paciente e vagarosa, dias depois de ter terminado uma longa maratona de protestos dos estivadores do porto de Lisboa. Vale a pena a viagem ao bulício da primeira metada do século XX.